quarta-feira, 7 de setembro de 2011

CRÍTICA NEGATIVA E CRÍTICA POSITIVA


CRÍTICA NEGATIVA E CRÍTICA POSITIVA
Lendo William Barclay, esse notável exegeta da Palavra de Deus e que é também um crítico sutil e espiritual das coisas de nossa época, tive­mos a ideia de escrever este editorial. Pensamos em intitu­lá-lo "A Arte de Criticar", mas depois achamos que seria título por demais pretensioso. Há, entretanto, uma arte de criticar, e aqueles que a ela se dedicam poderiam tomar em consideração os quatro pontos em que fixamos dois pontos negativos e dois aspectos positivos dessa arte.


Primeiramente, os negativos.  Há uma crítica  que  visa unicamente ferir o próximo. O crítico, nesse caso, quer fazer sofrer. Nisso deleita-se. É uma espécie de sadismo, a merecer tratamento enérgico. Para esse crítico nada presta. Ele eslá mal do fígado ou está mal com o mundo. É dessas pessoas que dizemos serem "do contra". Em muitos casos, viram-se frustrados em algum plano ou pretensão e agora, tendo oportunidade de falar ou de escrever, extravasam seu despeito ou sua frustração.   Vingam-se nos  outros  daquilo  que  sofreram. Como foram magoados, querem compensar-se magoando. Tal crítica pode revelar pontos fracos na obra criticada, mas provoca sensação de mal-estar. É inadmissível da parte de um crente. Porque o crente deve ser um permanente cultiva­dor da boa vontade para com os homens. Embora tudo lhe pareça ruim no trabalho de outrem, procurará distinguir alguma coisa que preste, e, se fizer crítica, há de fazê-la positivamente, como daqui a pouco veremos.



O segundo aspecto negativo é o da crítica apenas para afirmar superioridade. Nesse caso o crítico, quando se mani­festa, é como se estivesse dizendo: "Vejam como sou superior. Vejam como sou melhor. Vejam como sou mais inteligente e mais capaz. Se fosse realizar esse trabalho, não cometeria erros tão graves. É preciso que todos me leiam (ou me ouçam) para ficarem sabendo como as coisas devem ser feitas." Tal crítica também faz mal, porque ninguém gosta de assistir a demonstrações assim tão escancaradas de auto-suficiência. E muitos se sentirão inclinados a estabelecer comparações entre o trabalho criticado e a ausência de qualquer produção, que é frequente em muitos críticos desse tipo. Muitas vezes esse crítico descamba para a ironia ou a mordacidade e pode até impressionar leitores ou ouvintes durante algum tempo, até que todos entendam sua psicologia e vejam que essa ironia ou mordacidade são apenas expressões de impotência. Evi­dentemente, um crente não pode ser essa espécie de crítico, porque o crente autêntico é humilde e modesto, não se julga superior aos outros e não se compraz em humilhar ou diminuir ninguém.

O primeiro aspecto positivo é o da crítica para melhorar a si mesmo. Nesse caso, muitas vezes a crítica nem se torna conhecida dos outros. O crítico observa o que lhe parece ser falho no trabalho ou produção do criticado e se volta para dentro de si mesmo, a ver se, porventura, não tem cometido erros semelhantes ou, talvez, ainda mais graves. Intimamen­te, agradece essa oportunidade de auto-exame que lhe é proporcionada. Nas Escrituras muitas vezes encontramos a descrição de coisas más para servirem de escarmento aos que desejam praticar o bem. Esse tipo de crítica raramente é
comunicado, porque o crítico fica de tal maneira preocupado consigo mesmo que trata de autocriticar-se primeiro e, por vezes, tão-somente.
O segundo aspecto positivo é a crítica feita com amor. Pode ser falada ou escrita. Pode ser que o criticado não compreenda as intenções do crítico, mas os outros leitores e ouvintes compreenderão e agradecerão, porque mediante a crítica puderam fazer uma apreciação da obra em consideração. O que critica com amor reconhece os méritos evidentes ou em potencial do criticado e deseja sinceramente ajudá-lo. Se o criticado é humilde poderá melhorar sempre. Somos dos que acreditam que a crítica é necessária. Mas assim: com amor, com sincero interesse no crescimento e no aperfeiçoa­mento do que é criticado. Nada de expressar superioridade, nada de desforços pessoais. Os que recebem esse tipo de crítica podem não reconhecer seu valor ou sua justeza no primeiro impacto, mas depois, sendo humildes e crentes, hão de reconhecê-los e agradecer àquele que lhes chamou, com amor, a atenção para os erros cometidos.
É uma arte a ser cultivada. A boa crítica melhora. A má crítica agasta. Como crentes, devemos estar prontos a receber críticas assim. E, como crentes, devemos estar prontos a ajudar desse modo nosso próximo, que, tantas vezes, por razões tantas vezes compreensíveis, não é capaz de distinguir sozinho aquilo que lhe enfeia ou prejudica as obras que produz no terreno da literatura, da poesia, da música, de outras artes e no trabalho cristão em geral.

PEREIRA, José dos Reis, Mensagem: contos e crônicas - JUERP, Rio de Janeiro, 1989

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